quinta-feira, 26 de outubro de 2017

E calhando levo um tiro nos cornos que me f...


 
        1967
        20 de Maio
        Sábado, 21h30

 
    Hoje, da parte da manhã, foi «dia grande» na cidade. Foi festejado o terceiro aniversário de permanência do governador militar, nesta Província. O chefe da minha secção, dispensou a maior parte do pessoal, para assistir à parada, em frente ao palácio, e desfile das tropas pela avenida central.

Esta Sexta-feira, não recebi correspondência, como esperava, principalmente do meu amigo com o recorte do jornal com o anúncio do concurso de desenho do Diário Popular. Também esperava correspondência da minha vizinha, respondendo ao pedido que lhe fiz para ser minha madrinha de guerra.
Na Quarta-feira, recebi um aerograma da minha namorada, a fazer as pazes com o nosso amor. Não sei porquê, sinto que é ela mais o meu amor que eu o amor dela. Talvez ciúmes… não sei!    

Ultimamente, tenho andado um pouco doente. Sinto esta dor incomodativa do lado esquerdo do tórax que me perturba bastante. Já na Metrópole a sentia, mas nunca lhe dei grande importância. Aqui, com este clima e esta pressão, tem-se acentuado mais. Já por três vezes fui ao médico:  a primeira vez e a segunda receitou-me injecções; a terceira, quando lhe disse que fumava uma média de quarenta a cinquenta cigarros por dia, disse-me para fumar menos ou mesmo deixar de fumar. Disse-me, ainda mais, para não beber café, deduzindo que esta dor no peito terá origem no meu constante estado de ansiedade e que este era agravado pelo excesso de tabaco, álcool e café.
Reconheço que estes excessos à mistura com este clima doentio são, ainda, duplamente agravados e poderão ser a causa desta dor. 
Estou a lembrar-me, há uns dias atrás, da resposta que um camarada, alentejano, deu ao médico quando este lhe disse para não fumar tanto que, assim, prejudicava a saúde ao mesmo tempo que ia colecionando pregos para o caixão, ao que ele respondeu:
 «Ó, senhor Doutor! Já agora! Não fumo, não bebo, não f…!»
 «Porque estou eu pr’aqui marfado se daqui a três dias vou ‘bater’ com os ‘tomates’ no ‘mato’ e calhando levo um tiro nos cornos que me f...!»    
 
Ultimamente também me tem acontecido um facto que, não sendo estranho, me preocupa. Há noites que, ao sonhar com raparigas e algumas nem sequer conheço, me masturbo. Ainda esta tarde, quando dormia a sesta, acordei com esta sensação que me deixou indisposto.

São 22 horas, no momento que estou a terminar este capítulo. Estou no café Avenida com um meu camarada e amigo e não fomos ao cinema por não termos dinheiro.

 

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