23 de Junho
Sexta-feira,
Estou deitado sobre
a cama. Não posso sair. O comandante da Companhia “agraciou-me” com oit0 dias de dispensas cortadas, por ter faltado
à formatura do pequeno-almoço na passada Quarta-feira. Isto aconteceu porque na
noite anterior tinha-me deitado bastante tarde e cansado por andar a trabalhar
no citroen do furriel Santos.
Nesse dia tive uma zanga com o meu camarada e amigo
Silvestre, «vizinho do andar
debaixo, da casa do lado», por causa de uma conversa pouco amistosa.
Há já algum tempo que nós, «por tudo e por nada», nos
incompatibilizávamos. Precisamente no dia que fiquei “à pega”, por ter faltado à formatura, tinha de acontecer.
Eu estava muito agastado, por ter ficado “à pega”. E agora, mais esta, fiquei
pior que estragado.
Tudo começou por este meu camarada se meter à
conversa, com indiretas “foleiras”,
quando eu falava com o camarada, «meu
vizinho, do andar debaixo».
Ao regressar dos lavabos, depois de cortar
a barba, vejo umas cuecas imundas, por terem andado a arrastar pelo chão, em cima da minha
cama.
«O meu vizinho do andar debaixo» disse-me
que foi ele que as pôs ali, (não sei se, para me provocar, também) julgando que seriam minhas, uma vez que eu ponho a roupa
que lavo a enxugar numa corda esticada, entre os ferros da cama, por dentro da
rede mosquiteira. É este, em geral, o modelo de estendal de cada um.
Até aqui, depois de eu ter dito que esta
peça de roupa não era minha e que já a tinha visto a arrastar pelo chão, tudo
ia bem, não fosse este «meu vizinho, da casa do lado», intrometer-se com “bocas foleiras” que me deixaram num estado de irritação capaz de
rebentar.
Discutimos que até parecíamos
duas peixeiras do mercado do Bolhão e deixamo-nos de falar por algum tempo.
Hoje, às 15 horas, tive que encontrar-me na Primeira Repartição com
o meu chefe de serviço. Aqui trabalha o meu camarada e amigo Silvestre que se
meteu à conversa e começamos a falar. A zanga durou pouco tempo.
Às 18 horas começou a chover
torrencialmente e se não fosse o chefe ter posto o seu jipe ao nosso dispor,
ter-nos-íamos molhado todos, a apanhar boleia para irmos jantar.
Esta semana esperava bastante
correio e somente recebi um aerograma do meu irmão a dar-me a notícia que está
a tirar a especialidade de polícia militar no Regimento de Lanceiros, nº. 2.
Desde que vim para a tropa que não gramo, nem sequer um bocadinho, a maralha
desta especialidade. Parecem uns pavões a passearem-se com ares de muita
importância. Então quando me lembro que vim aqui parar a esta terra de satanás
por eles passarem no lugar errado à hora errada. Na verdade, tenho de ser
realista, a culpa foi somente minha, eu é que estava à hora errada no lugar
errado. Tenho-lhes um asco de morte, mas agora que lá está o meu irmão…!